A Lei 14.071/2020, que traz uma série de alterações no CTB (Código de Trânsito Brasileiro), começa a vigorar em abril trazendo uma vantagem relativa ao pagamento de multas.
Já sancionada pelo presidente Jair Bolsonaro, a nova legislação obriga a adesão dos órgãos autuadores ao SNE (Sistema de Notificação Eletrônica), que dá direito a pagar apenas 60% do valor de multas.
Disponível desde novembro de 2016, o SNE é um aplicativo gratuito para o público em geral. Permite receber notificações de infrações na tela do celular e pagá-las com 40% de desconto antes da data de vencimento – desde que o usuário reconheça a infração e abra mão de apresentar defesa e recurso.
Por vias tradicionais, o abatimento máximo é de 20%.
Apesar das vantagens, o SNE ainda é pouco conhecido e utilizado pelos brasileiros. Isso acontece porque o aplicativo abrange exclusivamente infrações geradas pelos órgãos autuadores que aderiram ao sistema, mediante a contratação do serviço. A adesão hoje é opcional e a base de usuários do sistema, relativamente pequena.
De acordo com Marco Fabrício Vieira, conselheiro do Cetran-SP (Conselho Estadual de Trânsito de São Paulo) e autor do livro “Gestão Municipal de Trânsito”, a obrigatoriedade de adesão ao Sistema de Notificação Eletrônica passará a valer devido a uma modificação no texto do Artigo 282-A do CTB, determinada pela nova lei de trânsito.
Hoje, esse artigo diz o seguinte:
“O proprietário do veículo ou o condutor autuado poderá optar por ser notificado por meio eletrônico se o órgão do Sistema Nacional de Trânsito responsável pela autuação oferecer essa opção”.
A Lei 14.071/2020 troca a palavra “poderá” por “deverá”.
Veja como ficará o Artigo 282-A:
“O órgão do Sistema Nacional de Trânsito responsável pela autuação deverá oferecer ao proprietário do veículo ou ao condutor autuado a opção de notificação por meio eletrônico, na forma definida pelo Contran [Conselho Nacional de Trânsito]”.
A redação do Artigo 284 também foi alterada, reforçando a obrigatoriedade de adesão ao SNE pelos órgãos emissores de multas de trânsito.
Além disso, o sistema eletrônico terá de disponibilizar na mesma plataforma campo destinado à apresentação de defesa prévia e recurso, quando o condutor não reconhecer o cometimento da infração e abrir mão do abatimento.
“A Lei 14.071/2020 suprimiu do Artigo 284 a expressão ‘se disponível’. Logo, o órgão ou entidade autuadora não terá outra opção senão oferecer o SNE ao condutor ou ao proprietário de veículo”, explica Vieira.
A lei e o desconto para todos
Para o conselheiro do Cetran-SP, a disponibilização do sistema eletrônico a todos os cidadãos é uma boa notícia.
“Além de beneficiar o usuário, o SNE resulta em economia para os cofres públicos no que tange aos gastos com impressão de notificações e expedição por correio. A legislação vigente prevê a obrigatoriedade de dupla notificação”.
O especialista explica que atualmente o órgão emissor tem necessariamente de expedir a notificação de autuação, comunicando o proprietário sobre o cometimento de uma infração e possibilitando a indicação de condutor e defesa prévia.
Mantida a autuação, esclarece, é expedida a notificação de penalidade, seguida pela abertura de prazo para recurso.
“Além disso, em caso de recurso em primeira e segunda instâncias, o órgão também precisa informar o resultado ao recorrente, expedindo as respectivas notificações. Tudo isso gera gastos”, complementa.
Julyver Modesto, mestre em Direito do Estado pela PUC-SP que atua como consultor e professor de legislação de trânsito, concorda que a medida é uma forma de facilitar a vida do cidadão.
“A iniciativa premia os condutores que reconhecem sua falha e querem pagar pela consequência dos seus atos o quanto antes, reduzindo a quantidade de recursos meramente protelatórios”, avalia Modesto, que também é conselheiro do Cetran-SP.
Ele, no entanto, critica o que considera “monopólio” do Serpro, empresa federal de processamento de dados responsável pelo SNE.
“Cada órgão deveria criar seu próprio sistema de notificação eletrônica, seja por e-mail, SMS ou até mesmo por WhatsApp, bastando que o interessado informasse tais meios de contato, concordasse em ser notificado dessa forma e houvesse controle de confirmação de recebimento”, pontua.
Na avaliação de Modesto, isso daria agilidade ao processo administrativo e uma grande economia para os órgãos públicos.
Já Vieira destaca que, na sua avaliação, o Sistema de Notificação Eletrônica precisa ser aperfeiçoado antes de se tornar obrigatório, sobretudo devido ao trecho da nova lei que prevê a possibilidade de apresentação de defesa e recurso na mesma plataforma.
“O governo federal, por meio do Denatran [Departamento Nacional de Trânsito], precisa reavaliar o custo de adesão ao sistema, de forma a tornar atrativa para todos órgãos e entidades”.
UOL Carros entrou em contato com o Denatran para comentar o suposto “monopólio” confira a íntegra da resposta:
“O Serpro oferece serviços de tecnologia especializados para os setores público e privado, entre eles, o Ministério da Economia, a Receita Federal, o Tesouro Nacional, o Banco do Brasil e, desde a década de 1990, o Denatran. O desenvolvimento dos sistemas vinculados ao Denatran teve início com o Renavam e hoje já são oito bases de dados monitorados pela instituição. Todos esses sistemas são de âmbito nacional, interligando os 27 Detrans. Os sistemas envolvem dados de milhões de veículos, condutores e infrações, o que exige um rigoroso processo de gerenciamento de riscos, com a manutenção de medidas e controle de segurança para a verificação e proteção crítica dos dados.
Desta forma, o Serpro, que é a autoridade na Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais e líder no desenvolvimento de tecnologias da informação utilizadas por órgãos do setor público brasileiro, é um prestador de serviços para o Ministério da Infraestrutura, em particular para o Denatran.
Vale lembrar ainda que, além da robusta infraestrutura tecnológica e ampla experiência com os grandes sistemas da Administração Pública Federal, a instituição possui um programa de integridade e boa governança, que busca prevenir, detectar e punir a ocorrência de fraudes, corrupção e desvios éticos que possam vir a ocorrer no âmbito do Serpro, promovendo confiança, transparência e efetividade na gestão corporativa”.
Quem já aderiu
Por meio do SNE, hoje é possível monitorar e quitar infrações emitidas em vias sob responsabilidade da PRF (Polícia Rodoviária Federal), da ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres) e do DNIT (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes). Portanto, os motoristas que forem multados em vias federais têm direito a requerer o desconto.
O SNE também permite pagar multas emitidas por 16 Detrans (departamentos estaduais de trânsito) e órgãos de fiscalização de mais de 80 municípios.
Os Detrans de São Paulo, Minas Gerais, Paraná, por exemplo, atualmente não integram o sistema, bem como capitais como São Paulo (SP) e Belo Horizonte (MG).
A lista completa dos emissores está disponível no site oficial do SNE.
Como se cadastrar
• Acesse o site do SNE (Sistema de Notificação Eletrônica) ou baixe o aplicativo nas lojas Play Store ou App Store.
• Em seguida, faça o cadastro, acionando login e seguindo as instruções da página de serviços do governo federal (acesso com CPF e senha ou via certificado digital).
• A próxima etapa é a ativação do cadastro, feita a partir de um link enviado ao e-mail indicado anteriormente.
• Selecione os veículos que deseja incluir no SNE por meio do link “Meus Veículos”.
Como solicitar o desconto
Ao receber notificação de multa, o proprietário do veículo cadastrado no SNE pode gerar o boleto eletrônico por meio do próprio aplicativo, que utiliza tecnologia de geolocalização para indicar os bancos conveniados para pagamento daquela infração – e se a cidade ou Estado onde você se encontra é coberta pelo aplicativo.
Para ter direito aos 40% de desconto, a multa tem de estar dentro da data de vencimento e o motorista precisa reconhecer o cometimento da infração. Quem decidir recorrer, mas ainda assim tiver de pagar, receberá o desconto dos tradicionais 20% se fizer a quitação dentro do prazo.
Para concluir o processo o sistema gera um código de barras, que permite a finalização via aplicativo do banco. Ou seja, dá para fazer a operação inteira usando o celular, desde que a instituição financeira do usuário permita. O SNE não tem opção de parcelamento.
Se você quiser indicar outro condutor para arcar com a multa e a respectiva pontuação na CNH (Carteira Nacional de Habilitação), é possível fazê-lo por meio do portal de serviços do Denatran.
Via: UOL